terça-feira, setembro 12, 2006

Um passeio pelo Douro...


Voltar ao Douro, é fazer um percurso pela infância com todas as surpresas, sabores e aromas que só aos seis anos sabemos gravar no olhar mágico… O recorte da “cabeça da velha” das montanhas do Marão, que se avista desde Fontes e nos afirma estar já próximo da quinta depois de um dia de jornada… Um dia do Porto a Tabuadelo com paragem em Felgueiras para almoçar e apanhar os primos, em Amarante para lanchar, os pregos do Zé da Calçada e as lérias da Lai-Lai (infelizmente encerrada), e chegar à quinta ao pôr-do-sol, para depois de uma rápida lavagem de mãos nos deliciarmos com o suculento jantar preparado pela Maria. (A Maria e Ana já lá estavam para preparar a nossa chegada). Na enorme sala de jantar de janelas abertas sobre o terraço das nogueiras, ouvia-se o cantar dos carros de bois caminho abaixo e acima, para o recolher, o trote dos burricos nos caminhos pedregosos (agora desaparecidos, mas ainda nos meus ouvidos) e o ensurdecedor grasnar dos gansos mal nos aproximávamos, quais cães de guarda que não reconhecem o dono... As grandes passeatas com visita obrigatória à D. Adelaide da Quinta do Outeiro, em Medrões, que nos preparava o lanche com scones ainda quentes, doce de abóbora com nozes, marmelada branca, vermelha e cristalizada, doce de marmelo em pedaços, e belas torradas de pão caseiro com manteiga a escorrer!
Aquelas montanhas que se tratam por tu de tão perto, e se agora há auto estrada até Santa Marta de Penaguião, as estradas ainda serpenteiam, e de cada barranco, de cada vertente, a paisagem aparece com distinto relevo, com outro perfil, de fraga e granito. Há que percorrê-la em todos os sentidos, subir a todos os penhascos… é um infinito, como o são todas as coisas para quem as quer conhecer por completo.
As vinhas, alguns soutos, algumas pequenas hortas de sustento, as belas quintas ou as suas ruínas (que também as há) se falassem e cantassem, seriam gente… Gente dura, gente brava, com pés de xisto e granito, que por estes mares de xisto construiu a paisagem, a demonstrar como é possível a harmonia entre o homem e o seu meio. Cada paisagem é o conjunto de faces que a integram e em que se subdivide, e por outro lado pertence a entidades mais amplas, a espaços maiores e obedece a forças muitas vezes invisíveis que operam na ordem social.
O meio físico condiciona a vida do homem, e é por isso que nestas bandas se desenvolve o instinto e a necessidade de luta, pois aqui vive-se ao redor da cepa, que exige a cava, a poda, a erguida, a estampa, a redia e por aí fora, até ao culminar da vindima… para recomeçar novo ciclo… A sua plantação é tarefa hercúlea aqui, nos terrenos saibrosos a pique que obrigam ao subi-los a cerrar os dentes, retesar os músculos, acordar e castigar o corpo que carrega todo o seu peso encosta arriba.
“Para cá do Marão, mandam os que cá estão!”… por muito que se discuta a sua vida, lá, nos bastidores de Lisboa.
A foto foi tirada na serpente de alcatrão que liga Medrões à Régua, pelo Loureiro, a caminho do saboroso lanche que lá nos esperava... presunto de Lamego, bola de bacalhau, e de carne... pão de Padronelo... uvas dedos de dama...rebuçados da Régua... cavacas de Resende... biscoito da Teixeira... e um delicioso Murganheira bem gelado...
BEIJOS

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